De dentro do cachimbo improvisado, a fumaça do crack leva oito segundos para alcançar o cérebro e provocar no usuário uma sensação intensa de euforia por não mais do que dez minutos. Do lado de fora, nas ruas onde a droga é consumida à exaustão no Brasil, seu impacto é muito mais duradouro.
Causa de um rombo bilionário no orçamento dos sistemas de saúde e segurança pública, o crack arrasta há anos um debate entre governo e sociedade sobre quais medidas tomar para combater sua disseminação pelos centros urbanos. O assunto está na pauta de discussões há pelo menos uma década, alimentada principalmente por imagens de um quadrilátero famoso no centro da cidade mais populosa do país, São Paulo, região degradada apelidada como Cracolândia.
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Essa novela ganhou um capítulo novo há um mês, quando Secretaria da Saúde e a Justiça paulistas deram início a mais um programa com o objetivo de combater o tráfego e o consumo da droga. O alvo da ação é justamente a Cracolândia – há um ano o local foi palco de uma desajeitada operação que, ao invés de colocar um ponto final nas concentrações de usuários em plena luz do dia, acabou por espalhá-las por toda a cidade.
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Dessa vez, a ação inaugura no Brasil o expediente da internação compulsória e imediata de dependentes químicos, procedimento que antes demandava a instauração de um burocrático processo judicial. Todo programa gravita em torno do Centro de Referência em Álcool, Tabaco e outras Drogas (Cratod), uma instalação milionária com 16 mil metros quadrados lançado há 11 meses.
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Informações preliminares dão conta que, desde o dia 21 de janeiro, data de inicio da parceria, o Cratod realizou 1.203 atendimentos e recebeu 6.093 ligações de usuários de droga ou familiares em busca de informações. Do total de internações, 90% foram realizadas voluntariamente. O restante, de forma involuntária, ou seja, com o consentimento da família. A Justiça não determinou nenhuma internação compulsória.
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Epidemia
Se a tentativa dará certo, ainda é cedo prever. No entanto, todo o país acompanha com atenção os balanços da ação. Isso porque, mais que um problema localizado, o crack é um mal generalizado. Que o diga o governo federal, que em 2011 lançou uma linha de investimento destinando R$ 4 bilhões até 2014 para combater o avanço da droga no país.
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Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo aponta o Brasil como maior mercado mundial do crack. Segundo a instituição, 2% da população (2,8 milhões de pessoas) faz uso da droga. A região Sudeste, a mais rica do país, concentra quase a metade dos usuários (46%), seguido pelo Nordeste (27%) e pelo Norte (10%).
Os pesquisadores estimam que existam 1,2 mil cracolândias no país.